quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017










NA OFICINA DE  

CORTE E COSTURA





A mãe deles era exímia costureira e ensinar sua arte era parte do oficio dela.

As aprendizes eram em sua maioria mocinhas chegadas de longe a se reunirem para as aulas na sala ampla de pé-direito alto, peça principal da casa assobradada, onde viviam pai, mãe e três filhos. Ali morava a família Martins convivendo com moldes, tesouras, moçoilas, botões e figurinos. Vindas de povoados vizinhos, as aprendizes tinham o objetivo de aprender a arte da costura a se prepararem para a lida no lar em primeiro lugar, pois que a vida era assim. Além da mãe, as tias dos três meninos também eram sabidas artistas criativas e talentosas na lida com a linha e as tesouras, apreciadas por suas habilidades e conhecidas como as graciosas filhas do sisudo ferreiro Belarmino, que falava alto também por conta do ofício e era conhecido como Bela. Esse o nome do pai e do avô. E tambem foi esse o mesmo que sapecaram no menor dos três netos paridos da filha - do meio -, naquela noite, para festejar o patriarca, que mal sabia ler e sequer entendia o que significava a palavra com a qual seus conhecidos o identificavam.

Belinho, assim tratavam ao mais novo dos descendentes do Bela e que era também o caçula dos netos, pois tinham outros primos de pouco conviver. 

Certo dia ele ouvia uma das mocinhas a buscar orientação fora do currículo com a mestra sua mãe, conversando junto ao vão da escada larga de madeira entre duas portas. Queixava-se a menina de se sentir sempre triste e cansada mesmo sendo adolescente e se saber saudável, com tanto por experimentar e aprender, reconhecia e revelava desditosa suas razões para tantas e tais tristezas, enquanto se mantinha assimilando as dicas de sabedoria que a mestra lhe oferecia. 

Belinho se habituara guardar em deduções o que apreendia das conversas ouvidas ao acaso.



Assim sendo, continuava a escutar o que dizia a aprendiz quando a mãe dele, que afirmando estar surpreendida pelo fato da lamentação vir de alguém tão jovem, perguntou à costureirinha, a mestra gentil com voz clara e com seu jeito de poeta repentista e carinhosa.

“- Se agora estás assim, que vai ser de ti, quando experimentar um dia, a verdadeira saudade?” 

Fez pausa a concluir audível, a frase que deixou cicatriz eterna na feição e na memória dele:

- “Como hoje me afeta, a mim, que por esses dias completarei trinta e sete anos de feliz idade? ”

Ao afirmá-lo e ignorando a origem das palavras, sua mãe tinha no rosto o sorriso límpido de quem inventa e provoca espantos, enquanto ele se surpreendia com o tanto de anos que ela já havia sobrevivido até ali. O susto se ampliou, quando percebeu nas palavras um outro entendimento, tanto no significado quanto na forma. Nunca lhe ocorrera tais invencionices, mesmo em alguém com a quantidade de tantos anos já vividos e ainda assim, afirmar que encontrava razões para dimensionar o gosto fino por manter a alma livre na eternidade. 

- “Certo, pois, só se pode ser feliz se si mantem a alma livre em qualquer das idades que se tem.” 

O velho vô Bela, à vista embaçada e mãos trêmulas, talvez se alegrasse ao constatar o tanto de tempo já sobrevivido em liberdade, presumiu assustado. Ele saberia, por certo, onde fica, como é e o que poderia ser a eternidade. Qual haveria de ser a dimensão dela? Seria suportável?”

 O menino começava naqueles dias, a lidar com suas primeiras respostas orfãs.

Conviveu com grande quantidade de dúvidas buscando resolve-las, até que teve início o processo de desvendar seus mistérios no varejo, pois, cada caso é um caso, o que viria a ser uma história paralela.

Vivia naqueles dias a maior das aventuras no ateliê de costura da mãe e foi, naqueles tempos que seus irmãos desbravaram os arquipélagos formados pelas bundas suaves e arredondadas das costureirinhas, a farfalhar alegres suas saias ao longo das aulas na lida de aprendiz. O fato é que seus irmãos haviam descoberto - os dois mais velhos e ao mesmo tempo -, as dezenas de bundinhas prensadas a escapar tentadoras pela larga trama da palhinha dos assentos a arrematar-lhe no avesso das cadeiras, o trançado e o teto das galerias, onde se sentavam aplicadas, as aprendizes.

Dizia-se sobre os largos vãos deixados abertos no trançado a se cruzar, que, “quanto mais espaçadas fossem as tramas mais essas refrescariam os aquecidos fundilhos das moças em dias de intenso calor, e seria esse um dos pecados capitais a restar de melhor, para justificar os pudores tropicais.”

Sentadas sobre os finos fios do rendado as moças se deixavam, a fim de aprender as artes da mãe mestra e costureira. Ficavam sentadas naquela posição por horas, entretidas na lida com agulhas, linhas, carretéis, moldes e botões. A fim de não amassarem os vestidos bem cuidados, as mocinhas levantavam as barras das saias engomadas ao se acomodarem. Jogavam-nas de lado, protegendo a intimidade das bundas recobertas por tênues malhas de algodão esgarçadas pelo uso, brancas e coladas na pele, pois se tivessem cores ou mesmo se fossem bordadas, seriam consideradas impróprias às moças de família. Não raro ocorria de as aprendizes se agruparem para trabalhar peça de costura maior ou mais elaborada, como lençois, colchas ou caudas de vestidos das noivas, dispondo as cadeiras de jeito a formarem longas galerias em retas ou curvas, sob os assentos em modelo austríaco, das pernas finas do móveis escuros. Seguros de não estarem sendo observados em suas traquinagens, os dois meninos iam e vinham durante a pecação que perpetravam ao invadirem o proibido inédito, ao longo das passagens recobertas por dezenas de bundinhas como tetas em seus tetos. Era assim que seguia, a vida pecadora dos irmãos. Mãe que gerenciava a casa e ministrava aulas, enquanto o pai - sisudo e severo - seguia cedo para o armazém de secos&molhados, no raiar do dia, saindo quando os filhos ainda dormiam. Lá ia ele para retornar a casa no entardenoitar pouco antes dos três seguirem de volta aos seus quartos, “em silêncio para suas camas, rezar e dormir”. Raro conviviam, filhos e pai, que não era de falar, bastava-lhe a maneira de olhar para resgatar expectativas, culpas e atiçar inseguranças tanto no trato como até mesmo no jeito de andar batendo o taco do sapato firme no assoalho.

DAS TEMERÁRIAS INCURSÕES RUMO AO PECADO.

As pernas finas das cadeiras se dispunham como colunas a suportar a aboboda da instigante galeria e ao longo dela se podia apreciar os estimulantes afrescos que, como graciosas saliências decoravam organizadas, os tetos encantados da galeria dos sonhos de meninos normais, iguais a eles.

Os irmãos maiores partiam sempre aventureiros e retornavam cobertos por militantas fantasias.

Poucas vezes permitiam a Belinho participar das considerações, findas as incursões, quando os ouvia falar das curvas e texturas campeãs que mais os havia impressionado. A cupola das galerias por onde se esgueiravam sub-reptícios era revestida pela trama de palha dividida em multifaces irregulares, que se encaixavam suaves a transformar os preciosos glúteos em pares de diamantes consistentes e macios a um só tempo. Um dia, porém, teriam ficado tão extasiados frente a um par deles ainda mais especiais e que os conquistou totalmente aos dois. Se ambos já se consideravam exploradores experientes, imagine, então, como enxergavam a um neófito, igual ao Belinho. Era normal, que no intenso verão, uma ou mais das moças viesse para a aula sem usar nada debaixo da saia por conta do intenso calor nas partes. Naqueles casos, o trançado da palhinha desenhava nádegas ainda mais rosadas, livres das calcinhas que, por mais esgarçadas que fossem ainda assim as embaçavam, explicava o irmão do meio, seu parâmetro, que falava pouco, sendo também bom de trato e de briga. Foram os dois mais velhos, pois, que lhe ensinaram as artes de ziguezaguear e de esquivar-se sem deixar pistas nos desvãos dos labirintos em frente, por dentro e por fora, desde velhos tempos, até os contemporâneos.

Magros e rastejantes ralavam costa, nuca e cotovelos por entre e sob os assentos de palhinha, apreciando os mais interessantes afrescos a decorarem o interior dis seus ”tetos”. Em alguns  casos a pele  da moça era lisinha a recordar grandes pêssegos frescos com delicada penugem, noutras lembrava lixa grossa, embora parecessem mornas, o que não era mau. Por isso, talvez, passassem a impressão de serem macias, mornas ou friazinhas, a manter vivas as dúvidas. 

-  “Não se podia tocar! Questão de princípio. Sequer pensar em alisar ou fungar. Muito menos lamber! Só seria permitido o privilégio de degustar com o olhar silenciosamente e sem sofreguidão. Continue enxergando, vendo, observe e espie bem, até entender tudo a se bastar e ponto final! ” Repetiam os dois mais velhos, fechando a questão.

Aquela era a lei e eles deixavam bem claro para Belinho. -“Só pode ver! Punto & basta!”

Às vezes liberavam os sonhos e a discreção dele obrigava-o a ouvir as considerações sem comentar. Caso o liberassem a usufruir daqueles privilégios, isso só estaria autorizado a acontecer estando ele a-com-pa-nha-do. Jamais poderia partir em uma incursão so-zi-nho. Só levado por guias a explicar onde e quando as coisas ocorrem. Experiente, um dos irmãos guia relembrava: -“A-com-pa-nha-do”, o que  atiçava nele interesses até então nunca des- per-ta-dos.

-  “Visitas solitárias ao ninho dos prazeres, aquilo jamais lhe passara antes pelos miolos!”

Falavam das nádegas prensadas contra o trançado das palhinhas, que ao explodirem pelo avesso formavam gomos arredondadinhos e - apenas deduziam - por certo maciinhos, tenros e doces como favos de mel, pois além da falta de imaginação, não havia, por certo, outros espaços tão ricos, para neles, eles sonharem. Relembravam as qualificações do traseiro desta ou daquela mocinha e detalhavam, fazendo-o corar. No grupo das gordinhas identificaram com gosto, o jeitão de uma delas, entre todas. Diziam que era assim-e-assado por ser a mais ampla e porque nela estavam as mais rosadas  e insinuantes almofadinhas, transformadas em alongadas saliências, glúteos macios e íntegros, comparava o mais experiente. Além de cheinha, aquela era a bundona mais fofa de todas e tinha uma pinta marrom do lado, cujo desenho lembrava o mapa da nação, confidenciou o irmão mais velho, acentuando o estilo ultra-especial, dizia o mais experiente e refinado deles, inclusive porque ele sabia onde e como utilizar expressões iguais a “estilo” e outras também raras de se escutar ou de se entender.

O tempo foi passando até que numa visita aos tesouros intocáveis dos desejos e, não resistindo as tentações de um dia especialmente quente com vários traseiros arejadamente descobertos, o irmão mais velho sucumbiu ao canto de uma das tantas sereias de sua Odisséia pessoal. O apelo pelado que lhe vinha do alto das galerias acabou por levá-lo a alisar suave, com as pontas dos dedos trêmulos, algumas almofadinhas daquele traseiro encantado, com o mapa da patria ao lado, o mesmo já antes mencionado. Falou de sua experiência aos companheiros - ansiosos e interessados -, aos quais passou a sensação de que havia sido fenomenal, e o gozo mais do que satisfatório, dizia com a autoridade de quem havia, efetivamente, tocado na coisa e sentido temperatura e textura. Se entre seus dedos e a pele macia da bunda havia ainda as finas palhas trançadas do assento a separá-los e ainda assim se enfeitiçara com o a satisfação de alisar as nádegas por inteiro e liberadas? Fantasiava sozinho, falando alto e temeroso, sabendo que estava efetivamente pecando, em pensamentos, palavras e ações. Depois recontava para ele mesmo sua emoção e dos riscos inerentes até o gosto de sentir se identificando com a emoção que lhe fazia transpirar o corpo de alto a baixo, sentindo rara e incontida vontade. “O desejo sem controle de pecar ainda mais lhe atacava bem no alto do vão das pernas. Tenha sempre muito cuidado ao mexer com essas coisas! Poderia estar por ali a chamada tentação”. Era o que dizia o mais experiente deles, relembrando os catecismos aos domingos depois da missa, “pois a tentação é contraparente do vício e prima irmã do pecado”, recordando o que dissera a catequista. Dos fatos, ele extraia a perversão e depois, com os temperos a seu gosto, traduzia os valores para todos seus ouvintes atentos, a anunciar sua liderança em matéria de pecar, pois, naquela paróquia ao menos, ele era o desbravador.

Pareceu estranho, porém, não ter registrado qualquer reação da aprendiz cujos alvéolos haviam sido acariciados, sem reagir às inéditas e inconvenientes provocações do primogênito. Ficaram todos eles em dúvida se a gordinha com o mapa no lado havia percebido ou não o atrevimento e se, por conta disso, aproveitava-se dos afagos ousados, e, que lhe teriam agradado, tanto a se sentir satisfeita, conivente e silenciosa, sem reclamar! A hipótese era ousada e nojenta, mas vinha de sua imaginação precocemente suja, e melhor, o fazia sentir-se com o rei na barriga. Nos dias que se seguiram à intrepidez do irmão mais velho, a moça da pinta no traseiro não veio a aula e todos se assustaram, inclusive Belinho - fora de qualquer suspeita -, um simples estagiário não remunerado. 

Enquanto reprimiam as ansiedades sobre os fatos, o primogênito, atrevidamente criativo, tentava repassar o que lhe vinha na cachola ou o que poderia estar, acontecendo por detrás das saias distraídas.

- “O que ocorre é...”- explicava em dissimulada modéstia e indisfarçada arrogância -...“que talvez a aprendiz tivesse percebido sua mão sábia e audaz, ainda que inexperiente, passeando pela bunda dela e por susto, não ter apreciado o trato e teria ido buscar explicações com o pai dela, que a proibira de voltar à aula e também se comprometera de ir conversar com o pai dos meninos a fim de buscar uma justificava para atitude tão atrevida”.  Destrinchava, justificava e se penitenciava pelo desastre.

Provavelmente, esclarecia por fim, breve seriam informados das conversações, “o que significava surra à caminho”, concluiu o do meio e o mais familiarizado com lembranças de tais rituais familiares.

Por serem mais velhos, os dois viviam horas de amarga expectativa, pois o pai deles não era de conversar e sabiam que cada lambada de seu cinto deixava marca prolongada e ardida. Assustavam-se mais, aqueles que já lhe haviam experimentado a zanga paterna em couro cru.

Belinho apenas acompanhava de longe a confusão, solidário à apreensão de seus sábios irmãos.

A não ser o retorno da estudante com o mapa no traseiro para as lições nas aulas seguintes e, sem que nada os houvesse acontecido de inesperado, o suspense que por tão extenso e em tão curto espaço de tempo espalhara a insônia e o temor entre eles, havia sido superado.

A tal angustia que por dias assombrara a cena se desfizera em nada, acabando em susto e paz.

A vida por fim, se acalmara para que algumas semanas mais tarde, numa manhã quente e ensolarada de verão - estando livre de tutela e sozinho no ateliê de costura da mãe -, enquanto farfalhavam alegres as aprendizes suas saias, Belinho começou a se deixar tomar por ideias inesperadas, inspiradas em subentendidas sugestões apreendidas ao acaso e por acaso em dias já passados. 

Enquanto os irmãos mais experientes tivessem sido levados à escola pela mãe para ter uma conversa com a diretora do Grupo Escolar, aproveitando a autonomia por decidir ele resolveu aventurar-se nas galerias da beleza - depois de ultrapassadas outras ignorâncias - e do pecado, contadas e decantadas por seus guias ausentes. Tratava-se de incursão ousada e vetada como vôo solo arriscado e já sabido. Sem instrutor ou rota definida partiria ele, tonto e pronto para os trancos, desvãos e desvios da fantasia, como bem já o faziam pelos ocos, sob os assentos das cadeiras “austríacas” das aprendizes, sua dupla de irmãos maiores e experimentados, senhores dos seus destinos.

Foi dessa forma decidida que Belinho resolveu sair, rota incerta e rumo quase ignorado, sob as bundas agrupadas no ateliê de corte e costura da mãe, que mesmo ausente dos planos naquela manhã, seguia tendo trinta e sete anos de feliz idade e quase metade desses em aprendizes reunidas no amplo ambiente de lições das artes da linha, do molde, da agulha, da tesoura e da costura a juntar as peças.

Sorrateiro e arrastando as costas sobre o chão de taboas limpas do salão bem tratado, ele seguia pela calorosa galeria recoberta de nádegas projetadas em losangos com  baixos e altos relevos belos e bem definidos pelo sombreado renascentista, protegida nas laterais por compridas e trabalhadas barras de saias bordadas com técnica e atenção redobrada. Indo de uma em uma, detinha-se nos tons róseas e nas texturas, volumes e curvas das bundas. Lá ia seu olhar inexperiente e cada vez mais deslumbrado com o que podia observar, começando a pecar com vagar e de manso, pela primeira vez. Eram suaves as tramas que, tanto na imaginação como de fato, sonhava em roçar leve a mão na superfície dos traseiros ao alcance do seu olhar. Apreciava o que via na santa paz da ignorância consciente e, seguia em frente quando lhe aprouvesse ou parava se lhe interessasse, lá ia magricela, sob coxas e glúteos, suspensos pelas finas colunas negras de suporte das cadeiras de modelo austríaco. O túnel onde se contorcionava lento e seguindo em frente a devorar as apreciaveis formas que cobriam o teto extenso o bastante para não ter mais fim, nunca mais. Três ou quatro cadeiras lado a lado e mais adiante, aquela que era a catedral das bundas enfileiradas, onde calcinhas brancas ressaltavam, ainda e, porém, novo inédito até então: Divididas as duas metades em formato alongado separadas em desenho de diamantes, convexas e fartas, ligeiramente alongadas lado a lado. As laterais dos róseos glúteos, na forma de conchas, flanqueavam em pares sutis, um “bosque” escuro, felpudo e fofo, sombreado, variado e espichado até sumir entre coxas roliças fundo afora - uns mais, outros menos intensos -, brandos e macios sobre os quais nada houvera apreendido ou lhe havia sido dito até então. 

A protuberância sombreada sobressaia a destacar-se entre coxas e glúteos. 

Podia-se perceber através da trama fina, a tessitura afofada da superfície. Aquele inédito inesperado também poderia interessar mais tarde, mas o objeto central de sua atenção pontual, eram os traseiros côncavos e macios já decantados e contados por seus irmãos. Atrapalhava-se, com a ausência do apoio técnico e da expertise fraterna ao ponto de confundir-se com a falta de assessoria prática, embora se encantasse com tudo aquilo. Tinha certeza, que por um instante apenas que fosse, todas aquelas bundas lhe pertenciam. Estava consciente da realidade implacável, assim como da frágil e precária posse a deter sobre o raro tesouro, entre sonhos e piratas, concorrência ousada, a enervar-lhe.

Podia apreciar até o fim, ou escolher sem açodamento e esse era o privilégio. 

A ausência dos seus mestres era complicada por um, mas, por outro lado, liberava espaço e facilitava o ir e vir. Sentiu que o imprevisível - por conta do despreparo - tornava mais grave a aventura que estava em confrontar-se com o inédito, para poder negociar em pé de igualdade.

Tudo ajeitado, podia então contemplar o conjunto de raridades com calma e sossego. Só se deu conta de tão rara e generosa prerrogativa, tantos e tantos anos passados.

Algumas bundas eram estreitas e parcimoniosas, nervosas, róseas, pacíficas ou incógnitas, outras eram mplas, largas e generosas. Por ali foi apreciando, na paz da manhãirembora, até que por fim se viu frente-a-frente com a dupla de glúteos nus mais róseos e jamais vistos por seus olhos incipientes ou mesmo ainda pelos experimentados olhares de seus sábios irmãos, pois o verão queimava até na sombra a dispensar as calcinhas da maioria delas. Como diziam seus mestres, aquela era a bunda mais extensa, intensa e gostosa de todas, o que lhe embaralhava as idéias, pois, para ele, gostoso era galinha ao molho pardo, goiabada com queijo e amor de mãe.

Centenas de tetas rosadas cobriam o céu da galeria ladeada pelas delicadas barras das saias sustentadas pelas pernas finas das cadeiras, deixando à mostra os premidos e desejáveis alvéolos a sobrevoar-lhe a cara assustada. Um grupo de tetinhas tépidas e tenras dançava frente seus olhos nunca tão abertos. Notou por fim a pinta marrom com o mapa da patria à direita da bunda magnânima a recuperar referências nascidas alhures.

Aquietou-se por instantes, saboreando a descoberta em aromático silêncio.

Com a visão desbravadora dos noviços, dimensionava o prazer de ter ao seu alcance a mais decantada das bundas paroquianas. Ainda não conhecia todas elas, mas a suave mácula marrom em formato cívico no lado esquerdo, não deixava dúvida. Os olhos espantados começaram por devorar a paisagem - que exibia na circunstância a possibilidade de esta ser sua única chance - e foi com relutância que cedeu à curiosidade, para ao fim, depois de resistir toda uma eternidade, avançar a mão tímida, em busca do tato nos alveolos. A ousadia acumulada no instinto reprimia a respiração inibindo-o e permitindo-lhe apreciar a textura de veludo macio e brando daquele traseiro, despertando a pele inédita da aprendiz com interdita e eriçada emoção. Aos poucos tudo aquilo mais lhe estimulava o interesse por passar a mão de vagar, ainda que trêmula, na seqüência de alvéolos macios a escaparem tramafora.

Assim o fez assustadiço, com a mão a se conter sôfrega e às falanges inseguras.

Sentiu primeiro com o nó na dobra dos dedos o contato com a pele da bunda ao seu alcance. Pelo instante de uma eternidade saboreou o momento enquanto estendia os dedos e depois a palma da mão aberta sobre o glúteo, ampliando a extensão do tato e multiplicando a satisfação do prazer. Fechou os olhos num sorriso jubiloso e dobrou os braços avançando os ombros ao apoiar-se nos cotovelos, e empurrando a boca qual girafa na busca da fruta predileta e por isso quase inalcançável. Alongava a ponta do queixo esticando o pescoço e o gógó sobre a garganta lentamente e cada vez mais para o alto. Esticava-se até apoiar a fronte nas tépidas e brandas almofadinhas no teto, sentindo sensação tão gostosa e acolhedora que o levava a esquecer por instantes a existência de outros planetas à sua volta, pois o universo estava todo ali. Experimentava aos poucos, com gosto e com vagar, o prazer do tato das tetas na testa e depois nas bochechas. Avançou mais a fronte para encostar a ponta do nariz na escura, misteriosa e fofa região situada entre as duas almofadas em padrão diamante, côncavas e alongadas. Afundou o nariz menino para vencer a palhinha da cadeira e aspirou forte o homem a afogar-se na satisfação de mergulhar as narinas indo mais fundo para desvirginar o desconhecido. Sentiu a fragrância nunca aspirada, que só anos mais tarde voltaria a experimentar saudoso. 

Aventura, tato, visão e olfato, jamais esqueceria aquela bunda, manhã ou aquele aroma.

Continuou desfrutando do conviver e do acariciar tépido e macio, quando aos poucos, quase que intuitivamente e sem perceber o fenomeno, seu pinto ainda infantil, de raro enrijecia-se e ao mesmo tempo ele começou a esticar a língua para fora da boca o mais longe que lhe foi possível a doer-lhe no pesoço e na nuca. Estendeu no ar - por certo tudo de que dispunha - cerca de meia braçada de língua ou quase já se esticava no vazio enquanto prelibava o júbilo e, ao fim se atreveu a dispará-la molenga e respingante, sobre boa parte das tetas quentinhas e macias da fragorosa bunda. 

Sentiu a textura, a forma e o calor no prolongado prazer de lamber, pois, mais se alongou na pratica mais prazer tinha, e ainda assim a degustação não lhe mudou o paladar. Sentia a grande satisfação promovida pelo fato e o tato, mas não sabia como se aproveitar melhor do sabor do feito, constatava alegriste, um pouco um e um pouco o outro, consciente e desiludido. Era, sem dúvida, muito boa a sensação de degustar a ação lambendo prazerosamente e em paz total as tenras tetas tentadoras.

Seria aquilo perversão? Seria assim tão bom pecar? Onde tudo é prazer?

Calmamente para não ser abrupto, mas estimulando inconsciente a luxúria ao desfrutar do contato na forma mais sutil e delicada possível sem provocar qualquer incômodo, apenas satisfação, tanto na ida quanto na volta, exercia seu despudor, pois era esse, o propósito final.

Pretendia passar despercebido como antes já ocorrera ao irmão mais velho, a não ser pela intenção de promover o júbilo da parte complementar, involuntariamente envolvida na operação, e pelo prazer de ter prazer, gostando de gostar do que fazia e era. Desejava que o atrevimento terminasse inconsequênte, tal qual sucedera ao primogênito, que de feito igual só colhera saberes e prazeres.

Mas aconteceu foi tudo bem ao inverso do que sinceramente ele esperava.

Desde o ato passaram-se anos e sentia sempre grande satisfação por delinqüir sem jamais se esquecer do prazer experimentado nos pecados daquela distante estréia. Quanto aos irmãos mais velhos, nunca também se esqueceram daquela manhã, por diferentes motivos. Mais pelos desdobramentos sinistros do fato narrado e que concluo na seqüência.

Depois que os acontecimentos se tornaram conhecidos, coube aos dois maiores serem levados ao tronco no pelourinho doméstico, onde foram justiçados por conta de suas fraquezas e perversões, além de arrastar com o menorzinho pelos caminhos da iniqüidade, segundo explicou mais tarde o catequista. 

Receberam os tratos devidos, dados a ambos, mas não Belinho - como pivô de toda trama -, visto ter sido ele o caçula pervertido pelas más influências. Autor do feito, sim, mas fê-lo em total inocência, concluíram os doutos juizes. Durante o período de avaliação dos fatos chegou-se a assistir o início dos preparativos do enxoval do caçula para ser internado como castigo, no sombroso Colégio Caraça, localizado na solidão e ao vento sibilante no alto das frias montanhas da Serra do Curral, memorável refúgio para meninos rebeldes atacados por  problemas de adaptação social naqueles dias. Por ser inexperiente nas artes de pecar - ainda que precoce e dissimulado -, Belinho acabou livrando-se da pena maior, por conta de um desleixe da vida, tendo, porém, de ouvir um carão que lhe doeu nos ossos então e até aqueles dias, tantos e tantos anos passados. E continua a doer hoje como antes. 

Pois foi a partir daquele incidente que Belarmino Azevedo Neto, o Belinho, irmão menor de Bartolomeu e Benedito Azevedo da Silva - que pela imprudência, impudência e ousadia foram sacrificados no pelourinho doméstico -, ficou sabendo que tinha o pleno direito de cumular fraquezas e assim começou a desfrutar do prazer da pecação, mal conhecendo, porém, sobre os deveres que se impunham pela imperícia de sucumbir a tantas, tontas e tais tentações.

Tempos depois ele descobriu que já não era mais quem havia sido, nem ele, nem seus irmãos ou mesmo seus pecados. Mas em suas lembranças a mãe dele continuava tendo a mesma idade e guardava no semblante a idêntica alegria do rosto sereno. Sorriso de quem não se esquece do que foi, sem medo do que virá depois, por ser assim que a mãe dele é, foi e para sempre há de ser, como a vê, no alto astral dos seus eternos 37 anos de feliz idade.                                                FIM - (23/07/014-ZAP

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